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PL da devastação avança no Senado e ameaça comunidades tradicionais

Proposta muda regras do licenciamento ambiental. Campanha liderada por organizações do terceiro setor pressiona o presidente da Câmara, Hugo Motta, a não colocar o projeto em votação

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Rafael Ciscati

4 min

(atualizado 28/05/2025 às 16h25)

Plenário do Senado Federal. Proposta que muda o licenciamento ambiental avança na Casa (Agência Senado)

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Você já ouviu falar em licenciamento ambiental? O termo pode não ser dos mais populares, mas sua importância é bem simples de entender: imagine que uma empresa decida construir uma nova fábrica no terreno ao lado da sua casa. É evidente que a obra, e a posterior operação do empreendimento, vai afetar a sua vida. O barulho, a fumaça, as árvores que a empresa terá de derrubar para erguer um novo prédio. Os impactos vão variar de acordo com o que a empresa pretende fazer no terreno ali ao lado.

Hoje, para autorizar a implantação e operação de novos empreendimentos — como a fábrica na sua vizinhança; ou uma estrada; ou a extração de petróleo na foz de um rio —, o poder público exige três coisas: que eles apresentem estudos técnicos detalhando como vão afetar o meio ambiente e as pessoas do entorno; que adotem medidas para mitigar ou compensar esses danos; e que, ao longo da sua operação, demonstrem que estão cumprindo o combinado.

É isso o licenciamento ambiental: um processo por meio do qual o Estado busca garantir que a fábrica que será instalada ao lado da sua casa não vai inviabilizar a sua vida e a da sua vizinhança. Quanto maior e mais danoso o empreendimento, maiores as exigências feitas pelo poder público para autorizar sua implantação e funcionamento.

Como disse o pessoal do Política por Inteiro — uma iniciativa do Instituto Talanoa, que monitora os movimentos da política climática — o licenciamento ambiental é uma medida de saúde pública. No limite, pretende garantir que a sociedade continue a ter água limpa para beber, alimentos de qualidade para comer e ar respirável. Bem razoável, né?

Na noite da última quarta-feira (21), o Congresso brasileiro deu um passo perigoso para implodir esse mecanismo de controle. Por 54 votos a 13, o Senado aprovou o Projeto de Lei 2.150/2021, que altera as regras do licenciamento ambiental no Brasil. A ideia da proposta, apoiada pela bancada ruralista, é flexibilizar e diminuir as exigências feitas pelo Estado para autorizar a realização e o funcionamento de novos empreendimentos.

Uma análise detalhada feita pelo Observatório do Clima mostra, por exemplo, que a proposta dispensa o licenciamento ambiental para várias atividades agropecuárias. Ganham dispensa, também, obras de saneamento básico e para a implantação de redes de energia elétrica de baixa tensão.

Outra novidade prejudicial é a criação de uma Licença por Adesão ou Compromisso (LAC). Ela permite que o empreendedor emita seu próprio aval para funcionar. Basta dizer que vai cumprir as exigências feitas pelos órgãos ambientais.

O texto ainda cria uma Licença Ambiental Especial. Trata-se de uma ideia introduzida no PL pelo senador Davi Alcolumbre, presidente do Senado. Ela acelera o processo de licenciamento para empreendimentos considerados estratégicos, independentemente do seu potencial para provocar danos ao meio ambiente.

Todas essas mudanças são criticadas por ambientalistas, que apelidaram a proposta de PL da devastação.

Os reflexos dessas mudanças afetam todo mundo. Mas chegam primeiro — e com maior intensidade— àquelas comunidades historicamente marginalizadas. (Já ouviu falar em racismo ambiental? Nesse webstory, a gente explica o conceito).

Na Brasil de Direitos, já contamos como, caso vire lei, as novas regras para o licenciamento ambiental vão ameaçar a existência de 99% das comunidades quilombolas do país. A conclusão consta em uma nota técnica publicada em novembro passado pelas organizações Terra de Direitos e pela Coordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).

Acontece que, pelas regras atuais, todo empreendimento econômico conduzido nas imediações de um quilombo precisa, antes de ser implantado, consultar o que pensam as comunidades quilombolas da região. A ideia é apontar quais impactos a atividade vai provocar ao modo de vida daquelas populações.

O PL flexibiliza essa obrigação: diz que só devem ser consultadas as comunidades que detenham o título de posse coletivo sobre as terras que ocupam. Elas são a minoria.

Para virar lei, o PL ainda precisa passar por mais uma rodada de votação na Câmara. Foi de lá que o projeto partiu em 2021. Se os deputados aprovarem as alterações feitas pelo Senado, o texto segue para sanção presidencial. Uma campanha liderada por organizações do terceiro setor pressiona o presidente da Câmara, Hugo Motta, a não colocar o projeto em votação

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