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Educação escolar indígena não é prioridade para o atual governo, diz ativista

Rafael Ciscati

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Foto de topo: Ativistas reunidos durante o VI Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena em 2022

Baixa oferta de ensino médio nas aldeias, formação de professores deficiente, problemas para garantir a permanência dos alunos nos cursos de graduação. A partir de quarta-feira (13), ao menos 500 ativistas devem se reunir em Brasília (DF) para discutir os problemas  enfrentados pela educação escolar indígena, e propor caminhos para resolvê-los. Já na sua sétima edição, o Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena acontece desde 2015. Neste ano, dentre as muitas demandas, quer cobrar mais recursos do governo federal para a criação de cursos de licenciatura indígena e programas de permanência universitária. O evento segue até sexta-feira (15).

A  educação escolar indígena é aquela tradicionalmente oferecida nas próprias aldeias. Tem especificidades: além do portugês, as aulas devem ser ministradas no idioma de cada povo, e devem respeitar suas tradições. Apesar de previsto em lei, esse modelo de educação ainda é considerado frágil: levantamento do Fórum de Educação Escolar e Saúde Indígena do Amazonas (Foreeia), a partir de dados do MEC, indica que há 3639 escolas indígenas em funcionamento no país.  Dessas, apenas 15% têm aulas de ensino médio. Dos 26243 professores indígenas formados, somente 44,53 % concluíram o ensino superior. 

“Os últimos quatro anos, sob a gestão Bolsonaro, foram uma terra arrasada para a educação “ , afirma a professora Alva Rosa. Coordenadora do Foreeia, Alva é uma das articuladoras do Fórum Nacional. “Esperávamos que as coisas melhorassem com a chegada do novo governo, mas pouco mudou “.

Alva avalia que, apesar de ter criado o ministério dos Povos Indígenas (MPI), o governo atual ainda não deu a devida relevância à pauta da educação. No final de 2022, um grupo de professores indígenas se reuniu com a equipe de transição para o novo governo, e  propôs a criação de uma secretaria de Educação Indígena no ministério da Educação (MEC). A proposta tornou a ser apresentada ao MEC em fevereiro deste ano. Não foi aprovada. “O governo  diz que não há recursos. Mas a gente vê que foram criadas outras secretarias”, diz a professora. “O problema é que, apesar de ser progressista, o atual governo não prioriza essa demanda”.

Segundo Alva, a criação da Secretaria é relevante porque ajudaria na busca por financiamento. “Quando vai discutir orçamento, o governo olha para a estrutura dos ministérios. E, hoje, a educação escolar indígena não aparece na estrutura do MEC”. 

Ela explica que os recursos são especialmente necessários para viabilizar aulas de ensino médio nas aldeias, uma das principais demandas do Fórum Nacional. 

Atualmente, essa etapa de ensino fica à cargo dos governos estaduais. Aos municípios, cabe financiar as aulas de ensino fundamental – a etapa que vai do primeiro ao nono ano. O diálogo com os estados, diz Alva, é truncado. “As secretarias de educação costumam argumentar que não há orçamento”, diz ela. “Mas é como um jogo de dominó: como o governo federal não prioriza a pauta, os governos estaduais também não dão importância”.  

Os dados do Foreeia apontam que, nas ocasiões em que há ensino médio nas aldeias, as aulas seguem currículos convencionais, não adaptados às especificidades dos povos originários.  

Essa etapa de ensino enfrenta, ainda, uma outra dificuldade: o pequeno número de cursos de licenciatura para formar professores indígenas. Antes de ser criados, os currículos desses cursos são discutidos com representantes dos povos aos quais são direcionados. “As licenciaturas do Alto Rio Negro são diferentes dos cursos para os Guarani do Mato Grosso do Sul. Porque são culturas diferentes”, diz Alva. Há, no ministério da Educação, um programa que apoia o desenho desses currículos. “Mas não há orçamento para o programa”, queixa-se ela. Sem cursos de licenciatura, faltam professores nas aldeias. 

Esvaziamento das aldeias

Alva conta que, para continuar estudando, é comum que os adolescentes indígenas tenham que cursar o ensino médio em zonas urbanas. Nas cidades, a educaçao não é adequada às suas especificidades culturais. Ela teme que essa migração para as cidades provoque o esvaziamento das aldeias. “As culturas indígenas valorizam muito o coletivo”, diz Alva. “Quando o adolescente vai estudar na cidade, a família inteira vai com ele”. 

Para a professora, cabe ao poder público criar condições para que os indígenas continuem em seus territórios. Essa permanência, diz ela, é essencial para a proteção das terras tradicionais. “Onde não há indígenas há grilagem e desmatamento”, afirma. “Nossas terras estão ficando vazias, porque a política pública não chega aqui”. 

Durante o encontro do Fórum Nacional em Brasília, os ativistas também devem discutir a criação de uma universidade indígena. O projeto constava no rol de propostas apresentadas ao MEC em fevereiro. Foi aprovada pela pasta, mas ainda não há definições sobre currículo e estrutura dos cursos. “Queremos participar da construção desse projeto”, diz Alva. 

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