Em Londrina, refugiados contam como é viver no Brasil
Vindas da Venezuela, famílias não pensam em voltar para o país natal. Mas sofrem com preconceito e dificuldade para encontrar emprego
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por Nelson Bortolin, da Rede Lume
Mesmo com todas as dificuldades de morar numa ocupação, não ter emprego e não falar bem o português, a vida está melhor para Lilimar Josefina Pinto Cupare, 47 anos, que chegou há seis meses em Londrina, vinda da Venezuela. Com apenas 50 dólares no bolso, uma filha de 25 anos e a sobrinha de 17, a família foi morar na ocupação Flores do Campo na zona norte, onde vive a maior parte dos venezuelanos que estão na cidade.
Lilimar foi uma das dezenas de refugiados que estiveram no campus da Universidade Estadual de Londrina (UEL) no final de outubro para participar da segunda edição do Encontro Migração e Refúgio: Participação e Construção Comunitária, promovido pela Prefeitura, Cáritas Arquidiocesana de Londrina e a própria universidade.
“Trabalhei como balconista em um supermercado por três meses. Mas tinha uma brasileira se metendo comigo. Foram muitas brigas e eu acabei pedindo para sair depois de cumprir minha experiência”, contou a venezuelana à Rede Lume.
Arrumar nova ocupação não está sendo fácil. “Já mandei muito currículo.” O fato de não falar bem o português atrapalha na hora das entrevistas. “Estou conseguindo entender bem a língua, mas tenho dificuldade em falar”, explica.
Lilimar não pensa em voltar à terra natal, tendo em vista que a crise econômica e humanitária se agrava por lá. Sua maior tristeza é estar longe da mãe. “Mas ela deve vir para cá no ano que vem.”
A venezuelana foi uma das pessoas fotografadas pelo projeto Sobre Humanos e Flores – iniciativa do PAIF/Movimenta CRAS e da Educomunicação da Epesmel, inspirado no projeto fotográfico Humans of New York. Clique aqui e leia mais.
Lilimar escolheu Londrina porque, na Venezuela, foi vizinha do pastor Luiz Rodríguez, que já está na cidade há mais de dois anos. Ele também participou do encontro na UEL. “É triste a vida que o povo da Venezuela está vivendo.”
Rodriguez mantém a Igreja Luz do Salvador no Flores do Campo. “Estamos aqui trabalhando para ajudar as pessoas que ficaram lá, nossos parentes e amigos”, conta.
A situação no país, de acordo com ele, piora. “Vi uma notícia de um acidente que aconteceu por lá e não tinha ambulância para transportar as pessoas de um hospital para outro. Elas foram levadas em caminhão de transportar areia.”
O pastor alega que coisas triviais no Brasil às vezes são consideradas luxo na Venezuela. “Eu vim com meu neto de 12 anos. Ele nunca tinha visto uma maçã na vida. A gente comia banana que plantava no quintal. Uma maçã, uma uva para nós, lá, é luxo.”
Questionado se os venezuelanos sentem discriminação em Londrina, ele conta que os primeiros a chegar enfrentaram dificuldades. As doações enviadas para eles causavam uma certa animosidade com os moradores brasileiros.
Mas hoje, de acordo com o pastor, venezuelanos e brasileiros vivem em harmonia na ocupação. Ele até já integra a associação de moradores do local. “A gente cuida para que não haja diferença entre os moradores. A relação melhorou muito”, alega.
Rodriguez não pensa em voltar para a Venezuela pois não vê futuro no país. O recente acordo do presidente Nicolás Maduro com a oposição, pelo qual foram convocadas eleições para 2024 e a consequente suspensão do embargo norte-americano ao petróleo venezuelano, não o empolgam.
“Isso é mentira do Maduro. A Venezuela é um país sequestrado, tem uma política sequestrada, instituições sequestradas. O dono de tudo tem um nome. Chama-se Nicolás Maduro. Ele controla o sistema eleitoral. Não vai perder.”
Prefeitura atende mais de 700 refugiados por ano
A prefeitura de Londrina não tem o número de refugiados e imigrantes que vivem na cidade. A Rede Lume buscou essa informação com a Polícia Federal, mas ainda não obteve resposta. De acordo com a secretária da Assistente Social, Jaqueline Micali, a pasta atende entre 700 e 800 estrangeiros por ano. “Foram 732 em 2021; 819 em 2022; e 743 de janeiro até setembro de 2023”, conta.
Aos refugiados, são garantidos todos os benefícios sociais ofertados à população brasileira, como o Bolsa Família. “Nós temos um programa de acolhimento onde explicamos os direitos que essas pessoas têm. A primeira coisa que eles se preocupam é com a documentação”, conta. A Prefeitura orienta sobre como obtê-la.
Após quatro ou cinco meses na cidade, de acordo com Micali, as pessoas são referenciadas em um Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) ou Centro de Referência da Assistência Social (Cras).
“As crianças já começam a estudar, as famílias já sabem onde fica o posto de saúde”, comenta.
A secretária diz estar atenta para o problema de o mercado de trabalho não aceitar a capacitação do estrangeiro. “Muitos vêm com mão de obra qualificada. Não é começar do zero. É começar a partir da qualificação que eles têm”, declara.
Mas é preciso combinar com os empregadores.
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