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O que é justiça climática? Entenda em 6 pontos

Expressão está ligada ao combate de desigualdades sociais em meio às mudanças climáticas

Bárbara Diamante *

7 min

(atualizado 30/05/2025 às 10h58)

A justiça climática reconhece que as mudanças climáticas afetam mais os grupos socialmente vulneráveis

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Os efeitos das mudanças climáticas não atingem todas as pessoas da mesma forma. Temperaturas mais altas, tempestades severas e secas prolongadas afetam com maior frequência áreas em desenvolvimento e com menos recursos. A justiça climática é um conceito que reconhece a necessidade de discutir e reverter essa situação.

O termo foi utilizado pela primeira vez no ano de 1999, em um documento intitulado “Greenhouse Gangsters vs. Climate Justice”. No relatório, pesquisadores questionavam a indústria do petróleo sobre as emissões excessivas de gases na atmosfera. Além do alerta a respeito dos danos ambientais, uma nova preocupação surgia: grupos socialmente vulneráveis eram mais impactados por eventos climáticos extremos, e algo deveria ser feito

Pouco antes da pesquisa ser lançada, o furacão Floyd havia devastado regiões costeiras do Bahamas e da costa leste dos Estados Unidos causando grandes danos, especialmente em áreas rurais e de baixa renda. Pensando nessas e em outras comunidades constantemente impactadas pelas mudanças climáticas, as soluções propostas envolviam reduzir as emissões de gases que estimulavam as mudanças no clima, e oferecer apoio financeiro às comunidades atingidas.

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O conceito de justiça climática é um desdobramento da justiça ambiental, que já era debatida anos antes, na década de 80. Segundo Maria Clara Salvador, pesquisadora e educadora do Centro Brasileiro de Justiça Climática (CBJC), enquanto a justiça ambiental foca nas pessoas afetadas diretamente pelo clima, “a justiça climática intensifica e especifica os impactos desproporcionais das mudanças climáticas sobre determinados grupos sociais”. A discussão passa a dar mais ênfase ao que ela chama de “aspecto interseccional” e pontos como gênero, raça e classe social ganham maior destaque.

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Quem é mais afetado?

Comunidades quilombolas, indígenas e moradores de áreas periféricas são os principais impactados pelas mudanças climáticas. E dentro desses territórios, grupos minorizados – como mulheres, crianças e idosos – tendem a ser ainda mais afetados, devido às desigualdades e discriminações já enfrentadas diariamente, que são agravadas no contexto de crise climática.

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Moradores de favelas, segundo o relatório de 2022 do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), morrem 15 vezes mais em decorrência de eventos climáticos extremos como secas e inundações, em comparação a pessoas de regiões mais protegidas. Bruno Milanez, professor de geografia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e doutor em política ambiental, co-autor do artigo “JUSTIÇA CLIMÁTICA E EVENTOS CLIMÁTICOS EXTREMOS: O CASO DAS ENCHENTES NO BRASIL” explica que locais mais pobres contribuem menos para o agravamento da crise climática por conta do estilo de vida mais simples dos habitantes; pouco utilizam meios de transportes poluentes e o consumo de carne é menor. 

Em contrapartida, eles estão mais suscetíveis aos impactos das enchentes e deslizamentos, uma vez que estão localizados geograficamente em lugares pouco favoráveis e com menor acesso a recursos básicos, como o saneamento. Sem recursos para melhorar a infraestrutura, muitos dos moradores são forçados a migrar para outros territórios.

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Por que discutir justiça climática?

Desde a criação do termo, a discussão sobre justiça climática ganhou cada vez mais visibilidade. O tema frequentemente é abordado em pesquisas e levado a ambientes de maior alcance, como a COP16 (2010). Em 2015 ele ganhou ainda mais força, com a criação do Acordo de Paris – tratado assinado por 190 países que visa limitar o aquecimento global a 1,5ºC em relação ao período pré-industrial. 

Reuniões como a Conferência das Partes (COP) e acordos como o de Paris auxiliam a atingir os objetivos centrais da justiça climática:

  • Tornar o assunto tema do debate público;
  • Responsabilizar países e empresas causadoras dos maiores impactos ambientais;
  • Direcionar mais recursos a locais vulneráveis. 

Discutir justiça climática, para Maria, também é “pensar na possibilidade de construir políticas públicas que olhem diretamente para esses grupos [mais vulneráveis]”. Com a recorrência de eventos climáticos extremos – como as enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul em abril de 2024 e as ondas de calor ao redor do país no início de 2025 -, ela ressalta que ter a perspectiva de justiça climática em meio a essas situações é importante: “a emergência climática é algo que está na nossa porta. É o debate do século”.

 

Como lutar por justiça climática?

Não existe uma “fórmula secreta”, mas a coletividade é a chave para avançar nas questões de justiça climática. Para Bruno, da UFJF, pensar em um debate envolvendo outras pessoas é muito mais eficaz que focar em soluções individuais.

A participação em ações coletivas é mais simples do que parece, e pode acontecer em todos os espaços: em uma ONG, em um coletivo ou, até mesmo, em reuniões de condomínio. O mais importante é se questionar: “como eu posso me mobilizar, com outras pessoas, para pressionar agentes políticos a tomarem decisões que minimizem essas desigualdades?”. 

Maria também acredita que o debate é importante e afirma que incluir educação climática no plano pedagógico das escolas é uma boa alternativa. Assim, é possível inserir as discussões de maneira natural no cotidiano das crianças e adolescentes e mantê-los engajados desde cedo.

Ela salienta, também, que é fundamental saber ouvir o que pessoas que estão “dialogando diretamente com a crise climática” têm a dizer. E exemplifica essa importância citando as mulheres negras, que geralmente exercem o papel de promotoras de soluções, mas são pouco valorizadas. “São elas que conseguem um colchão para uma casa quando alaga, que conseguem alimentação. Ainda assim, ao discutir desigualdade social, o Brasil não as insere no debate”.

Justiça climática para atingir a transição energética justa

Bruno diz que “a transição energética é como se fosse um quebra cabeça. E a justiça climática é uma das peças que compõem esse quebra cabeça”. Sem a justiça climática, não é possível garantir que a transição para fontes de energia renováveis seja feita de maneira equitativa. Maria destaca a importância de escutar e integrar as comunidades tradicionais no processo. “Elas já possuem soluções para energia, para agroecologia. E precisam ser incorporadas nessa ideia de progresso.”

 

Entenda o que é Transição Justa:

 

Conheça também outros conceitos relacionados à justiça climática:

 

Foto de topo: Mídia Ninja

 

 

*Estagiária sob supervisão de Rafael Ciscati

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